João Caetano admite aceitar o desafio de propor uma auditoria às contas da Câmara de Portimão
Entrevista a João Caetano, presidente da concelhia de Portimão do CDS, partido que faz parte da coligação ‘Servir Portimão’, que, nas últimas autárquicas, atingiu o estatuto de segunda força política mais votada no concelho.
Algarve Marafado (AM) – No discurso comemorativo do 25 de Abril, a presidente da Câmara de Portimão, Isilda Gomes, desafiou a oposição que não confia nas suas contas a pedir uma auditoria independente. O CDS e a coligação ‘Servir Portimão’ vão aceitar este repto?
João Caetano (JC) – Isso vai ser discutido internamente, no âmbito da coligação ‘Servir Portimão’, e eu acho que, à partida, temos todas as condições para aceitar positivamente esse repto e ir por esse caminho, pois estamos à vontade nas críticas que fizemos. Os aspectos que focámos no nosso comunicado, relativamente ao relatório de execução das contas de 2015, reflectem o nosso entendimento sobre aquelas contas, têm fundamento na análise que fizemos e nos documentos que nos foram apresentados e têm também eco no relatório do Revisor Oficial de Contas (ROC), que manifesta reservas em relação às contas que foram apresentadas.
Portanto, em relação a esse desfio, estamos perfeitamente à vontade, não temos problema nenhum em aceitá-lo, mas vamos debater isso internamente e, a seu tempo, vamos dar uma resposta concreta à senhora presidente.
AM – Portanto, depois das explicações que Isilda Gomes deu, vocês mantêm as mesmas críticas? Nomeadamente, em relação à empresa municipal ‘Portimão Urbis’, a presidente de Câmara disse que todas os seus compromissos e dívidas estão reflectidos nas contas que apresentou. O ‘Servir Portimão’ mantém que não estão?
JC- Sim, continuamos a manter. Tenho à minha frente o relatório do ROC e se a senhora presidente ler com atenção, sem posições de princípio, sem preconceitos, aquilo que aqui está escrito, facilmente chegará à conclusão que as críticas que lhe foram feitas no nosso comunicado têm razão de ser.
Para já, teve uma atitude que estranho um bocadinho. Numa sessão em que se comemora a liberdade reagiu mal e de forma muito agressiva a críticas. Parece que só está satisfeita quando a oposição elogia e cauciona as medidas do executivo. Sempre que critica, acha que ou está de má-fé, é ignorante ou ‘bota-abaixo’. Talvez tivesse necessidade de fazer uma cura de oposição para saber como se deve comportar a oposição.
A senhora presidente tem sido, fundamentalmente, uma administradora da dívida do município e tem-se encarregado, desde 2014, de preparar o terreno para as medidas que são impostas pela Comissão Executiva do Fundo de Apoio Municipal (FAM).
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AM – Mas podia fazer mais do que isso, tendo em conta a situação financeira que encontrou?
JC – Podia e devia ter feito. A primeira falha capital deste executivo foi ter assumido o caminho mais fácil, que foi abordar uma série de forças políticas – nomeadamente, a nossa e o vereador que foi eleito pelo PSD que, depois, como se sabe, passou para o lado do PS – tentando arranjar um apoio para ter a maioria no executivo e na Assembleia Municipal. Na altura, criticámos esse comportamento… repare, nós não fomos para o executivo com pelouros porque não quisemos, pois fomos a primeira força política a ser abordada pela senhora presidente. Dissemos que, em consonância com aquilo que assumimos com o eleitorado antes das eleições, iríamos ser oposição, não queríamos pelouros, que não era aquela a nossa solução, nem era aquela a nossa visão do concelho.
A senhora presidente quis encontrar uma solução de maioria que é artificial, pois não há consonância nenhuma politica com as pessoas foram eleitas pelo PSD e que apoiam o PS no executivo e na assembleia. Aquilo é um acordo de circunstância, diria quase que é uma situação de concubinato político, é pura conveniência politica para todos.
Em vez disso, a senhora presidente devia ter optado por procurar fazer consensos alargados, caso a caso, nomeadamente quando se tomassem medidas mais gravosas e difíceis.
AM – Uma espécie do que António Costa fez a nível nacional, é isso?
JC – Se quiser… mas a situação que António Costa encontrou, infelizmente para a dra. Isilda Gomes, não era a que ela encontrou em 2013, em Portimão, que era muito mais grave.
Mas procurando responder concretamente à sua pergunta: com o fim da ‘Portimão Urbis’ houve ali situações que, manifestamente, não se compreendem. A decisão de internalizar funcionários, só para dizer que se mantiveram os postos de trabalho – o que é uma falácia, pois ela nem sabe se consegue manter esses postos de trabalho – foi uma péssima solução, porque não foi feito um diagnóstico das necessidades que havia, em termos de recursos humanos, da Câmara e da empresa municipal EMARP.
Nunca defendi, nem defendo despedimentos pura e simples, nem extinção de postos de trabalho, nem, como ela disse no discurso do 25 de Abril, que fosse declarada a insolvência da ‘Portimão Urbis’. O que é facto é que se optou por uma solução extremista, no sentido de internalizar as pessoas que não aceitaram uma rescisão amigável e não se atacou o problema da despesa primária.
AM – Mas o que está a dizer não implicava o despedimento de pessoas?
JC – Nunca defendemos isso. O que entendemos é que devia ter sido feita uma avaliação das necessidades, o que nunca aconteceu. Se se chegasse à conclusão que havia excedentes de recursos humanos, tínhamos que encontrar uma solução para essas pessoas. Havia formas jurídicas de salvaguardar os seus interesses, de garantir que, se fosse esse o caso, saíssem da ‘Portimão Urbis’ com uma compensação e direito a Fundo de Desemprego. Assim, as pessoas que foram internalizadas fizeram contrato a termo certo com a Câmara ou com a EMARP. Agora, teve que se abrir concursos e aquelas pessoas não têm garantias nenhumas de ficarem com o emprego, pois qualquer pessoa com ou sem vínculo à função pública pode concorrer. Estão, assim, sujeitas a ficarem desempregadas e sem compensação nenhuma.
VENDA DE PATRIMÓNIO IMOBILIÁRIO DA CÂMARA DEVIA TER SIDO PONDERADA
AM – Em relação à ‘Portimão Urbis’, que outra solução havia?
JC – A ‘Portimão Urbis’ tinha e tem dívidas muito elevadas e, portanto, ou se fazia uma negociação directa com os credores, nomeadamente, os principais, reduzindo drasticamente a dívida ou, então, havia uma solução que nós não defendíamos – mas parece que há aí pessoas que apontavam para esse caminho – que era declarar a insolvência, como, aliás, foi feito em relação a outras empresas das quais o município de Portimão era accionista.
Mas a ‘Portimão Urbis’ é apenas um dos problemas do município. A senhora presidente gosta de dizer que resolveu ou estancou a questão da dívida. Circunstancialmente, isso até pode ser verdade. O problema é que temos agora um instrumento que é o Fundo de Apoio Municipal (FAM), que parece estar em vias de ser aprovado e que vai constituir um ónus muito pesado durante 25 anos, quer para a autarquia, quer para as empresas, quer para os habitantes do concelho. Se for aprovado, tenho muitas dúvidas que o peso dessa dívida seja suportável, ao longo de 25 anos. Dificilmente este instrumento irá garantir a sustentabilidade da dívida e a garantia de receitas capazes de suportarem não só o pagamento dos encargos desse empréstimo como, sobretudo, assegurarem as necessidades de investimento do município e também, enfim, a satisfação das necessidades básicas da população de Portimão.
A.M – Está a dizer que a Câmara não devia ter-se candidatado ao FAM?
JC – A Câmara não tinha opção, estava numa situação em que era obrigada a aderir ao FAM.
AM – Então se era obrigada, se fez isso, qual é a questão que coloca? O que é que deveria ter feito de diferente?
JC – Entendemos que poderiam e deveriam ter sido exploradas medidas que, com maior ou menor esforço, iriam garantir uma redução do montante do empréstimo, uma redução do tempo de amortização do empréstimo e, por essa via, um menor esforço para os portimonenses e para as empresas.
Nomeadamente, estou a pensar na rentabilização e alienação de património imobiliário que a Câmara tem. A sua inventariação creio que está feita e ninguém diz como é que esse património vai ser rentabilizado.
AM – Voltando à questão da ‘Portimão Urbis’, o que é que devia estar nas contas da Câmara e não está? São as dívidas?
JC – São responsabilidades que não estão reflectidas no relatório e nas provisões que foram feitas. O relatório do ROC fala nessa questão e na responsabilidade que decorre da extinção da ‘Portimão Urbis’. A sua liquidação não está concluído e há montantes que ainda são desconhecidos, os quais terão, necessariamente, um reflexo nas contas do município. Da forma como nós analisámos a execução de 2015, esses valores não foram devidamente provisionados nas contas.
AM – No vosso comunicado, também dizem que houve uma grande diminuição dos apoios sociais por parte da Câmara. Isilda Gomes já veio dizer que o que aconteceu é que a rubrica contabilística a que se referem, para além dos apoios sociais, também englobava verbas que eram transferidas para a ‘Portimão Urbis’, o que já não aconteceu o ano passado. Portanto, que a diminuição se refere a essas verbas e não a cortes sociais. Ficou convencido com esta explicação?
JC – Eu não consigo perceber como é que se misturam numa rubrica de apoios sociais verbas que vão para a ‘Portimão Urbis’. Que me recorde, a esmagadora maioria das competências que foram sendo transferidas para a ‘Portimão Urbis’ não tinham nada a ver com funções sociais. Mas talvez, na próxima Assembleia Municipal, a senhora presidente queira explicar essa questão, de uma forma mais clara e menos agressiva, já agora.
A seguir: João Caetano fala da polémica da destruição da rotunda da Praia de Alvor e da possibilidade de haver candidaturas comuns com o PSD, nas próximas eleições autárquicas.
(Nota: Esta é uma série de entrevistas a políticos com responsabilidades no concelho de Portimão, que começou com Hélder Renato, líder local do PSD, e pretendemos que inclua representantes de todas as forças representadas nos órgãos autárquicos. Contamos que um dos próximos seja o presidente da concelhia local do PS, Filipe Vital, que, já há algum tempo, foi convidado para o efeito)
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